A glória de Cristo manifestada pelo mistério das Suas duas naturezas
A glória da dupla natureza de Cristo numa só pessoa é tão grande que o mundo incrédulo não pode ver a luz e a formosura que dela brilham. Hoje em dia, muitos negam a verdade de que Jesus Cristo é tanto Filho de Deus como Filho de homem. Mas esta é a glória, a qual os anjos “desejam olhar” (1Pe 1:12). Satanás no seu orgulho levantou-se contra o Deus do Céu e então, tratou de destruir os seres humanos na Terra que foram criados à imagem de Deus. Na Sua grande sabedoria, Deus uniu ambas as naturezas (a humana e a divina) contra as quais Satanás tinha pecado. Cristo, o Deus homem, triunfou sobre Satanás mediante a Sua morte na cruz. Aqui está o fundamento da Igreja. Na criação, Deus “suspende a Terra sobre o nada.” (Job 26:7). Mas, Ele fundou a Sua Igreja sobre a rocha imóvel: “Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo.” (Mt 16:16) Este glorioso ato é referido por Isaías: “Porque um menino nos nasceu, um filho se nos deu; e o principado está sobre os seus ombros; e o seu nome será Maravilhoso Conselheiro, Deus Forte, Pai da Eternidade, Príncipe da Paz.” (Is 9:6)
Como o fogo ardia na sarça que Moisés viu, assim a plenitude da divindade morava no corpo de Cristo o qual foi feito carne e habitou entre nós. (Veja-se Ex.3:2, Cl 2:9 e Jo 1:14) O fogo eterno da natureza divina estava na sarça da frágil natureza humana; não obstante, a natureza humana não foi consumida. Então, podemos ver “a graça daquele que habitou no arbusto” para conosco, os pecadores (Dt 33:16). Como foi dito a Moisés que tirasse os seus pés, assim também nós devemos pôr de lado todas as imaginações e desejos que provêm da nossa natureza caída a fim de que por meio da fé cheguemos a ver a glória de Cristo Jesus.
Não é meu propósito dar uma explicação ou confirmação da verdade gloriosa das duas naturezas (divina e humana) unidas na pessoa de Cristo. O meu desejo agora é o de estimular as mentes dos crentes a uma contemplação da glória de Cristo no santo mistério da constituição da Sua pessoa, quer dizer, como Deus e homem num. Espero que o que é dito a seguir nos anime a procurar de Deus, o espírito de sabedoria e de revelação para abrir os olhos do nosso entendimento.
1. Devemos estar absolutamente seguros de que esta glória de Cristo na Sua natureza humana e divina é o melhor, o mais nobre e o mais útil dos temas em que podemos pensar. O Apóstolo Paulo diz que todas as demais coisas são como perda, e em comparação com esta verdade, como o esterco (Veja-se Fl 3:8-10). As Escrituras falam da necedade das pessoas que gastam “o dinheiro naquilo que não é pão; e o produto do vosso trabalho naquilo que não pode satisfazer” (Is 55:2). Eles fixam os seus pensamentos nos seus prazeres pecaminosos e recusam ver a glória de Cristo. Algumas pessoas são capazes de alcançar pensamentos muito elevados acerca da criação e da providência divinas. Mas não há nenhuma glória nestas coisas comparadas com a glória da dupla natureza de Cristo. No Salmo 8 David está meditando na grandeza das obras de Deus. Isto fá-lo pensar na pobre e débil natureza humana, a qual parece como nada em comparação com a obra de Deus. Mas então, David começa a admirar a sabedoria, a bondade e o amor divino por exaltar a nossa natureza humana (na pessoa de Cristo) muito por cima das obras da criação. O Apóstolo explica isto em Hb 2:5-6; veja também o Salmo 8. Quão prazenteiras e desejáveis são as coisas deste mundo: esposa, filhos, amigos, posses, poder e honra, etc. ... Mas a pessoa que tem todas estas coisas e também um conhecimento da glória de Cristo dirá: “A quem tenho eu no Céu senão a Ti? E na Terra não há quem eu deseje além de Ti.” (Sl 73:25) Porque “Pois quem no Céu se pode igualar ao SENHOR? Quem é semelhante ao SENHOR entre os filhos dos poderosos?” (Sl 89:6)
Apenas um olhar à formosura gloriosa de Cristo é suficiente para conquistar e capturar os nossos corações. Se não estamos olhando para Ele frequentemente e pensando na Sua glória é porque as nossas mentes estão muito ocupadas nas coisas terrestres. Então, não estamos aferrando-nos à promessa de que os nossos olhos verão o Rei na Sua formosura.
2. Uma das atividades da fé consiste em esquadrinhar as Escrituras porque elas declaram a verdade acerca de Cristo. Ele mesmo nos exortou a fazê-lo: “Examinais as Escrituras... e são elas que de Mim testificam” (Jo 5:39). Vemos a glória de Cristo nas Escrituras de três maneiras:
a) Pelas descrições diretas da Sua encarnação e do Seu caráter como o Deus homem. Veja-se Gn 3:15; Sl 2:7-9; 45:2-6; 78:17-18; 110; Is 6: 1-4, 9:6; Zc 3:8; Jo 1: 1-3; Fl 2:6-8; Hb 1: 1-3, 2:4-16 e Ap 1:7 e 18.
b) Por incontáveis profecias, promessas e outras expressões que nos conduzem a considerar a Sua glória.
c) Pelas instituições sagradas de adoração divina que Deus estabeleceu sob o Antigo Testamento, e pelo testemunho direto dado acerca dEle no Novo Testamento. Isaías disse: “Eu vi o Senhor assentado sobre um alto e sublime trono; e o seu séquito enchia o templo.” (Is 6:1) Esta visão do Cristo divino foi tão gloriosa que os serafins cobriam os seus rostos (Veja-se Is 6:1-3 e Jo 12:41). Quanto maior foi a glória revelada abertamente nos dias dos Evangelhos! Pedro diz-nos que ele e os outros Apóstolos foram testemunhas da majestade de nosso Senhor Jesus Cristo: “Porque não vos fizemos saber a virtude e a vinda de nosso Senhor Jesus Cristo, seguindo fábulas artificialmente compostas, mas nós mesmos vimos a Sua majestade, porquanto Ele recebeu de Deus Pai honra e glória, quando da magnífica glória Lhe foi dirigida a seguinte voz: Este é o Meu Filho amado, em quem Me tenho comprazido.” (2Pe 1:16-17) Deveríamos ser como aquele mercador que buscava toda a espécie de pérolas. Quando encontrou aquela pérola de grande preço vendeu tudo o que tinha e comprou-a (Mt 13:45-46). Cada verdade sagrada da Escritura é uma pérola que nos enriquece espiritualmente. Mas quando nos encontramos frente à glória de Cristo, encontramos tanto gozo que jamais nos separaremos desta pérola preciosa. A glória da Bíblia é que ela agora é o único meio que nos ensina a glória de Cristo.
3. Devemos meditar frequentemente no conhecimento da glória de Cristo que recebemos da Bíblia. As nossas mentes deveriam ser espirituais e santas, livres das preocupações e dos afetos terrestres. A pessoa que não medita agora com deleite sobre a glória de Cristo nas Escrituras, não terá nenhum desejo real de ver essa glória no Céu. Que espécie de fé e de amor têm as pessoas que têm tempo para meditar em muitas coisas, mas não têm tempo para meditar sobre este assunto glorioso?
4. Os nossos pensamentos deveriam voltar-se para Cristo cada vez que tenhamos oportunidade em qualquer momento do dia. Se formos crentes verdadeiros e se a Palavra de Deus mora em nossos pensamentos, então Cristo sempre estará perto de nós (Veja-se Rm 10:8). Descobriremos que Ele está disposto a falar conosco e a ter comunhão connosco. Cristo diz: “Eis que estou à porta e bato.” (Ap 3:20) É certo, que algumas ocasiões parece que Cristo Se afasta de nós e não podemos escutar a Sua voz. Mas quando isto ocorre, não devemos contentar-nos, antes devemos atuar como a noiva nos Cantares de Salomão e buscá-lO com diligência: “De noite busquei em minha cama aquele a quem ama a minha alma; busquei-o e não o achei. Levantar-me-ei, pois, e rodearei a cidade; pelas ruas e pelas praças buscarei aquele a quem ama a minha alma; busquei-o e não o achei. Acharam-me os guardas, que rondavam pela cidade; eu perguntei-lhes: Vistes aquele a quem ama a minha alma? Apartando-me eu um pouco deles, logo achei aquele a quem ama a minha alma; detive-o...” (Ct 3:1-4). A experiência da vida espiritual num Cristão será forte em proporção com os seus pensamentos e o seu deleite em Cristo o Qual vive nele. (Veja-se Gl 2:20) Às vezes diz-se acerca de duas pessoas que uma vive na outra. Mas isto só pode acontecer quando os seus corações estão tão unidos que ambos de dia e de noite vivem nos pensamentos um do outro. Assim deveria ser entre Cristo e os crentes. Cristo mora neles pela fé, mas os crentes experimentam o poder da Sua presença somente quando os seus pensamentos estão cheios dEle. Portanto, se queremos ver a glória de Cristo devemos encher-nos de pensamentos acerca dEle e da Sua glória em todo tempo. E quando Cristo estiver ausente dos nossos pensamentos por um tempo, então devemos repreender-nos e pôr-nos a buscá-lO na oração, na meditação, na leitura da Palavra, etc.
5. Todos os nossos pensamentos acerca de Cristo e da glória deveriam ser acompanhados por admiração, adoração e ação de graças. É nos mandado amar o Senhor com toda a nossa alma, mente e forças (Veja-se Mc 12:30). Se somos crentes verdadeiros, a graça de Deus obrará em nossas mentes e almas para nos ajudar a fazer isso. Na vinda de Cristo como o Juiz no dia final, os crentes serão cheios de um sentido angustiado de admiração perante a Sua aparência gloriosa, “Quando vier para ser glorificado nos Seus santos e para Se fazer admirável, naquele Dia, em todos os que crêem” (2Ts 1:10). Esta admiração se converterá em adoração e ação graças como o exemplo que nos dá em Apocalipse 5:9-13 onde a Igreja dos redimidos canta um novo cântico: “E cantavam um novo cântico, dizendo: Digno és de tomar o livro e de abrir os seus selos, porque foste morto e com o teu sangue compraste para Deus homens de toda tribo, e língua, e povo, e nação; e para o nosso Deus os fizeste reis e sacerdotes; e eles reinarão sobre a Terra. E olhei e ouvi a voz de muitos anjos ao redor do trono, e dos animais, e dos anciãos; e era o número deles milhões de milhões e milhares de milhares, que com grande voz diziam: Digno é o Cordeiro, que foi morto, de receber o poder, e riquezas, e sabedoria, e força, e honra, e glória, e ações de graças. E ouvi a toda criatura que está no Céu, e na Terra, e debaixo da Terra, e que está no mar, e a todas as coisas que neles há, dizer: Ao que está assentado sobre o trono e ao Cordeiro sejam dadas ações de graças, e honra, e glória, e poder para todo o sempre.”
Há algumas pessoas que esperam ser salvos por Cristo e ver a Sua glória no mundo próximo, mas não se preocupam com meditar acerca desta glória neste mundo. São como Marta que se preocupava de muitos quefazeres e não como Maria quem escolheu a boa parte, sentando-se aos pés de Cristo (Veja-se Lc 10:38-42). Tais pessoas deveriam tomar cuidado para não descuidar o dever de meditar na glória de Cristo e também de não menosprezar este dever.
Alguns dizem que têm o desejo de olhar a glória de Cristo pela fé mas quando começam a fazê-lo, encontram que lhes é demasiado elevado e difícil. Sentem-se abrumados como os discípulos no monte da transfiguração. Reconheço que a debilidade das nossas mentes e a nossa incapacidade para entender muito acerca da glória eterna de Cristo nos impede de mantermos os nossos pensamentos firmes e fixos por muito tempo na meditação. Aqueles que não estão acostumados na arte da meditação santa não estarão habilitados para meditar neste mistério em particular. Mas ainda assim, quando a nossa fé já não pode concentrar os olhos do nosso entendimento para pensar no Sol da justiça brilhando na Sua formosura, pelo menos podemos, por meio da fé, descansar na santa admiração e no amor.
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