terça-feira, 2 de outubro de 2012

DISTINÇÃO ENTRE A JUSTIFICAÇÃO E A SANTIFICAÇÃO




J. C. Ryle
         Em que concordam e no que diferem? Esta distinção é muito importante, ainda que possivelmente à primeira vista, não o pareça. Em geral, as pessoas mostram certa predisposição para considerar só superficialmente a fé, e a relegar as distinções teológicas como «meras palavras» que em realidade têm pouco valor. Atrevo-me a exortar àqueles que se preocupam com as suas almas a que se afanem por obter noções claras sobre a santificação e a justificação. Lembremo-nos sempre de que ainda que a justificação e a santificação sejam duas coisas distintas, em certos pontos concordam. Vejamo-lo em pormenor.
                                                        PONTOS CONCORDANTES
         Ambas procedem da livre graça de Deus e têm nela a sua origem. Ambas são parte do grande plano de salvação que Cristo, no Pacto Eterno, tomou sobre Si, a favor do Seu povo. Cristo é a fonte de vida de onde fluem o perdão e a santidade. A raiz de ambas está em Cristo.
Ambas se aplicam na mesma pessoa. Os que são justificados são também santificados, e aqueles que foram santificados, foram primeiro declarados justos. Deus uniu-os e não podem separar-se.
         Ambas começam ao mesmo tempo. No momento em que uma pessoa é justificada, começa também a ser santificada, ainda que, ao princípio possivelmente não se aperceba disso. Ambas são necessárias para a salvação. Jamais alguém entrará no Céu sem um coração regenerado e sem o perdão dos seus pecados; sem o sangue de Cristo e sem a graça do Espírito; sem uma disposição apropriada para gozar da glória e sem o título para a mesma.
                                                        PONTOS EM QUE DIFEREM
         Pela justificação, a justiça de outro – neste caso de Jesus Cristo– é imputada, posta na conta do pecador. Pela santificação, o pecador convertido experimenta no seu interior uma obra que o vai fazendo justo no seu caráter e personalidade. Dito por outras palavras, pela justificação declara-nos justos, enquanto que pela santificação nos faz justos.
         A justiça da justificação não é feita pelo próprio, mas é a justiça eterna e perfeita de nosso maravilhoso mediador Cristo Jesus, a qual nos é imputada e que fazemos nossa pela fé. A justiça da santificação é a nossa, repartida, inerente e influenciada em nós pelo Espírito Santo, mas mesclada com fraqueza e imperfeição.
         Na justificação não há lugar para as nossas obras. Mas na santificação a importância das nossas próprias obras é imensa, daí que Deus nos ordene a lutar, a orar, a velar, a que nos esforcemos, a que nos afanemos e a que trabalhemos.
         A justificação é uma obra acabada e completa: no momento em que uma pessoa crê é justificada, perfeitamente justificada. A santificação é uma obra relativamente imperfeita; será perfeita quando estivermos no Céu. A justificação não admite crescimento, nem é susceptível de aumento. No momento de ir a Cristo pela fé, o crente goza da mesma justificação que gozará por toda a eternidade. A santificação é uma obra eminentemente progressiva, e admite um crescimento contínuo enquanto o crente viva aqui, na Terra.
         A justificação faz referência à pessoa do crente, à sua posição diante de Deus e à absolvição da sua culpa. A santificação, por outro, refere-se à natureza do crente, e à renovação moral do coração. A justificação dá-nos o título de acesso ao Céu, e confiança para lá entrar. A santificação prepara-nos para o Céu, e previne-nos para os seus gozos.
         A justificação é um ato de Deus em referência ao crente, e não é discernível para os outros. A santificação é uma obra de Deus dentro do crente que não pode deixar de manifestar-se aos olhos dos demais.
         Pomos estas distinções à atenta consideração dos leitores. Estamos persuadidos de que grande parte das trevas, confusão e, inclusive, sofrimento de algumas pessoas muito sinceras se deve a que confundem e não distinguem a santificação da justificação. Nunca se poderá enfatizar muito o fato de que são duas coisas distintas, ainda que em realidade, não podem separar-se, e que o que participa de uma tem de participar iniludivelmente da outra. Mas nunca, nunca, se deve confundi-las, nem se deve esquecer jamais a distinção que existe entre ambas.

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