sexta-feira, 19 de outubro de 2012

O HOMEM DE UMA SÓ MENSAGEM Spurgeon



I. A nossa primeira consideração esta manhã será: QUAL ERA ESSE TEMA, A QUE PAULO SE TINHA DETERMINADO CONFINAR, QUANDO ELE PREGAVA À IGREJA DE CORINTO? Esse tema era um, ainda que muito bem pudesse ser dividido em dois —era a Pessoa e a obra de nosso Senhor Jesus Cristo— pondo especial ênfase naquela parte da Sua obra, a qual sempre enfrenta as maiores objeções, isto é, o Seu Sacrifício substitutivo, a Sua morte redentora. Paulo pregava a Cristo em todos os Seus ofícios, porém, dava particular importância a Cristo crucificado.
         O Apóstolo, primeiramente, pregava sobre a Pessoa do seu grandioso Mestre, Jesus Cristo. Quando Paulo falava de Jesus de Nazaré, não havia nenhuma margem de dúvida. Apresentava-O como um homem real — e não como um fantasma— que foi crucificado, morto e sepultado, e que ressuscitou dos mortos com uma existência corporal real. Tampouco havia nenhuma dúvida a respeito da Sua Divindade. Paulo pregava a Jesus como o Filho do Altíssimo, como a sabedoria e o poder de Deus, “no Qual habita corporalmente toda a plenitude da Deidade.” Ao escutar-se Paulo, não existia nenhuma dúvida de que cria tanto na Divindade como na Humanidade do nosso Senhor Jesus Cristo — que Lhe rendia culto e O adorava como ao Deus verdadeiro de Deus verdadeiro. Pregava a Sua Pessoa com toda a claridade de linguagem e também com todo o calor do amor. O Cristo de Deus era Tudo em Tudo para Paulo.
         O Apóstolo falava igualmente com toda clareza do trabalho do Redentor, pondo especial ênfase sobre a Sua morte. “Horrível”, dizia o Judeu, “como podes vangloriar-te acerca de um Homem que morreu como um criminoso e que era maldito já que foi pendurado num madeiro!” “Ah”, dizia o Grego, “não queremos saber mais do teu Deus que morreu! Deixa já de palrar a respeito da ressurreição. Nunca vamos crer em semelhante loucura.” Mas, Paulo não pôs de lado estas coisas dizendo “Senhores, começarei por contar-vos a vida de Cristo e a excelência do Seu exemplo — e mediante isto espero convencer-vos de que havia algo de Divino Nele, para posteriormente concluir que Ele fez uma expiação pelo pecado.”
         Justamente o contrário, ele começava com a Sua bendita Pessoa e claramente O descrevia conforme tinha sido ensinado pelo Espírito Santo! E quanto à Sua crucificação, punha-a em primeiro plano, dando-lhe o lugar de proeminência. Não dizia: “Bem, por agora não tocaremos o tema da Sua morte” ou “Consideraremo-lo da perspectiva de um martírio mediante o qual Ele ratificou o Seu testemunho”, Não! Paulo glorificava no Redentor crucificado, o Cristo morto e sepultado, o Cristo que carregou com os pecados, o Cristo feito maldição por nós, como está escrito: “Maldito todo aquele que for pendurado no madeiro.” Este foi o tema em que ele se concentrou em Corinto — e não tocou em nenhum outro. Mais ainda, não somente decidiu limitar a sua pregação a esse ponto, mas, resolveu, também, não saber de nenhum outro tema! Ele queria excluir da sua mente qualquer outro pensamento, exceto o de Jesus Cristo e Este crucificado!
         Isto deve ter parecido muito pouco político. Consultai uma assembleia de sábios segundo o mundo, e certamente condenarão este enfoque imprudente; em primeiro lugar, este tipo de pregação afastaria a todos os Judeus. Estando os Judeus apegados às Escrituras do Antigo Testamento, e conhecendo os ensinos sobre o Messias, e crendo firmemente na unidade da Deidade, eles tinham avançado um bom trecho para a luz — e se Paulo tivesse evitado os pontos de discórdia por um pouco de tempo mais— não tê-los-ia aproximado um pouco mais, e assim, gradualmente, os conduziria à cruz? Os sábios teriam assinalado a esperança que havia para os Israelitas, se ele os tratasse com discrição, e o seu conselho teria sido: “Não te pedimos que renuncies aos teus sentimentos, Paulo, simplesmente disfarça-os por um pouco de tempo mais! Não digas o que não é verdade, porém, ao mesmo tempo, sê um pouco reticente acerca do que é verdade, para não espantares a estes judeus cheios de esperança.”

         O Apóstolo não cedia ante tais políticas! Assim ele não ia ganhar nem a Judeus nem a Gentios dizendo verdades pela metade, posto que sabia que tais convertidos não são verdadeiros. Se o homem que está perto do reino vai ser afugentado do Evangelho ao ouvir a crua Verdade, isso não é da responsabilidade de Paulo; Ele sabe que o Evangelho deve ser para uns “aroma de morte para morte”, enquanto que para outros “aroma de vida para vida”, e, portanto, independentemente do resultado, ele devia entregar a sua própria alma: os resultados não diziam respeito a Paulo, mas ao Senhor! A nós corresponde-nos dizer a Verdade com denodo, e em cada caso seremos um aroma grato a Deus. Mas querer contemporizar, esperando obter conversões, é fazer um mal para obter um bem — e isto deve estar fora da nossa consideração a todo momento!
         Outro diria: “Mas Paulo, se tu fizeres isto, vais gerar oposição. Não sabes que o Cristo crucificado é um objeto de escárnio e uma recriminação para todos os seres pensantes? Em Corinto há um bom número de filósofos, e, crê-me, farás um ridículo monumental se apenas abres a tua boca para falar do Crucificado e da Sua ressurreição. Não te lembras de como se escarneceram de ti na Colina de Marte, quando pregaste sobre esse tema? Não lhes provoques o seu desprezo! Debate com o seu Gnosticismo e mostra-lhes que tu também és um filósofo. Sê todas as coisas para com todos os homens. Sê um intelectual entre os intelectuais e mostra a tua retórica entre os oradores. Mediante estas técnicas farás muitas amizades e assim gradualmente a tua conduta conciliatória conduzi-los-á a aceitar o Evangelho.”
         O Apóstolo sacode a sua cabeça, o seu pé golpeia o chão, e com voz firme declara: “Já o decidi”, diz, “cheguei a uma conclusão, estais desperdiçando os vossos comentários e o vosso conselho no que a mim concerne. Decidi não saber nada no meio dos Coríntios —sem importar quão cultos sejam os que ali são gentios, ou quanto amem a retórica— só quero saber de Jesus Cristo, e Este crucificado.” Essa é a posição de Paulo. É muito importante observar adicionalmente que o Apóstolo estava convencido de que o seu tema ia atrair de tal maneira os seus ouvintes, que ele não precisava de recorrer à excelência das palavras para apresentá-lo, nem adorná-lo com a sabedoria humana.
         Talvez vós tenhais escutado do famoso pintor que retratou o rei Jaime I. Ele representou-o sentado sob uma caramanchão com todas as flores da estação ao seu redor — e ninguém emprestou a menor atenção ao rosto do rei, posto que todas as olhares eram cativadas pela beleza das flores! Paulo resolveu não ter flores ao seu redor! O quadro que ele ia desenhar devia ser de Cristo crucificado, sem adornos, e a doutrina da Cruz, com exclusão de qualquer flor que proviesse de poetas ou de filósofos! Alguns de nós devemos ser discretos a respeito da nossa resolução de evitar uma linguagem florida, já que podemos ser muito pouco dotados a esse respeito. Mas o Apóstolo era um homem de poderes naturais sutis e de vastos predicados pessoais — um homem ao qual não poderiam desprezar os críticos de Corinto— se bem que Paulo se tenha despojado de todo o ornamento para dar passo à beleza sem adornos da Cruz!
         Da mesma maneira como ele não adicionaria flores, tampouco ia enegrecer a Cruz com fumo, pois há uma forma de pregar o Evangelho que o asfixia no mistério e na dúvida, de tal maneira que os homens não podem recebê-lo. Um grupo numeroso de pessoas está sempre aquecendo e removendo um gigantesco caldeirão filosófico, fumegante com um denso vapor, que oculta a Cruz de Cristo da maneira mais horrível. Ai daquela sabedoria que oculta a Sabedoria de Deus! É a mais culpada forma de loucura. Algumas pessoas pregam a Cristo, da mesma maneira como é representado, às vezes, um casco de um navio de guerra, em alguma pintura. O pintor pintou unicamente o fumo, de tal forma que te perguntas: “E onde está o navio?” Pois bem, se olhares com atenção, podes, eventualmente, discernir um fragmento da parte superior de um dos mastros, e, talvez, uma porção da sua estrutura; o navio estava ali, indubitavelmente, mas o fumo oculta-o! Da mesma maneira Cristo pode estar na pregação de alguns homens, mas esta pregação encontra-se rodeada de tanta nuvem de pensamento, de tão densa cortina de profundidade, de tão horrível roupagem de filosofia, que vos impedem de ver o Senhor!
         Paulo pintava sob um céu limpo. Não queria utilizar nenhuma escuridão ilustrada; decidiu abandonar toda a técnica da oratória quando falava; para não pensar com a profundidade com que presumem os filósofos, mas apenas saber de Jesus Cristo, e Este crucificado — e apresentá-Lo na Sua própria beleza natural, sem adornos. Ele prescindiu de todo o elemento acessório que tendesse a distrair o olho da mente do ponto mais importante — Cristo crucificado. “Um experimento imprudente”, diria alguém. Ah, Irmãos, é o experimento da fé, e a fé é justificada por todos os seus filhos! Se confiarmos no simples poder da persuasão, confiamos no que é nascido da carne! Se dependermos do poder da argumentação lógica, então novamente confiamos no que é nascido da razão do homem! Se confiarmos nas expressões poéticas e nos atrativos rodeios da linguagem, estamos procurando meios carnais.

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