SPURGEON
“Porque Cristo, estando nós ainda fracos, morreu a seu tempo pelos ímpios.” (Romanos 5:6 )
Mais ainda, esta
doutrina tem a particular característica de abrandar o coração. Há na história
do sacrifício de Cristo um misterioso poder para abrandar e derreter. Conheço
uma apreciada mulher cristã que amava os seus pequenos filhos e procurava a
salvação deles. Quando orava por eles, considerava correto usar os melhores
meios para ganhar a sua atenção e despertar as suas mentes. Espero que todos
vós procedais da mesma maneira. Todavia, o meio que ela tinha considerado como
o mais efetivo para o seu objetivo era o dos terrores do Senhor. Ela costumava
ler aos seus filhos, capítulo após capítulo, o livro “Alarme para os Inconversos”
de Alleine. Oh, esse livro! Quantos sonhos provocou no seu filho nas
noites, acerca de devoradoras chamas e queimaduras permanentes!
Entretanto, o coração do moço foi-se endurecendo, como se fosse recozendo, em
vez de derreter-se no forno do medo. O martelo soldou o seu coração para o
pecado, mas não o partiu.
Mas, ainda então, estando endurecido o
coração do moço, quando escutava sobre o amor de Jesus pelo Seu povo, se bem
que temia não contar-se entre eles, ainda costumava chorar ao pensar que Jesus
pudesse amar a alguém com essas características. Até agora, que alcançou a
idade adulta, a lei e os terrores matam-no, sem o perturbar, mas ao Teu sangue,
Jesus, à Tua agonia no Getsêmane e sobre o madeiro, não pode resistir;
derretem-no; a sua alma derrama-se em lágrimas através dos olhos; chora até
ficar vazio, com amor agradecido por Ti, por tudo o que tens feito. Ai daqueles
que negam a expiação! Tiram o aguilhão do sofrimento de Cristo; e então, ao
tirá-lo, suprimem a ponta por meio da qual os sofrimentos de Cristo traspassam
e exploram e penetram no coração. Posto que Cristo sofreu por meus pecados e
foi condenado, eu posso ser absolvido e não ser condenado por causa da minha
culpa: é isto o que faz com que os Seus sofrimentos sejam um bálsamo para o meu
coração.
“Olha como no
sangrento madeiro
O ilustre sofredor
pende,
Pelos tormentos que
te correspondiam;
Ele suportou as
terríveis dores
E saldou ali a
pavorosa soma
De todos os pecados
presentes, passados e que hão de vir.”
Neste mesmo instante há congregações
reunidas nos teatros de Londres, e há pessoas que lhes estão pregando, não sei
precisamente sobre o quê, mas eu sei qual deveria ser o seu tema. Se querem
alcançar o intelecto dos que vivem na periferia, se querem tocar as
consciências dos que são ladrões e bêbados, se querem derreter os corações dos
que se têm tornado teimosos e duros durante anos de concupiscência e
iniquidade, sei que apenas o que pode obtê-lo é a morte no Calvário, as cinco
feridas, o flanco sangrando, o vinagre, os pregos e a lança. Há ali um
enternecedor poder para obtê-lo que não se pode encontrar em nenhuma outra
parte do mundo.
Vou deter-me uma vez mais neste ponto.
Nós elogiamos a doutrina da expiação porque sabemos que, além de adequar-se ao
entendimento, de aquietar a consciência e de derreter o coração, tem poder para
afetar a vida exterior. Nenhum homem pode crer que Cristo sofreu pelos seus
pecados e ainda viver em pecado. Nenhum homem pode crer que as suas iniquidades
mataram a Cristo, e, apesar disso, acariciá-las no seu peito. O efeito certo e
seguro de uma verdadeira fé no sacrifício de expiação de Cristo, é o de limpar
a velha levedura, o dedicar a alma Àquele que a comprou com o Seu sangue, e o
compromisso de vingar-se daqueles pecados que cravaram a Cristo no madeiro. O
melhor é que isto pode-se comprovar. Vá a qualquer bairro na Inglaterra onde
viva um teólogo filósofo que tenha eliminado completamente a expiação da sua
pregação, e se não encontrar mais prostitutas e ladrões e bêbados do que o
usual, então estou completamente equivocado; mas, por outro lado, vá a outro
bairro onde se prega a expiação, com rígida integridade e seriedade amorosa, e
se não encontras as cervejarias ficando vazias e as lojas fechadas aos domingos
e o povo vivendo com honestidade e retidão, então terei observado o mundo em
vão.
Conheci, numa ocasião, uma povoação que
era possivelmente a pior das povoações da Inglaterra por muitas razões: muitas
destilarias ilícitas estavam produzindo o seu nocivo licor para um fabricante
que não pagava impostos ao governo e onde, em conexão com o mesmo, abundava
toda a classe de desordem e de iniquidade. A esse povo chegou um jovem, que não
era mais que um moço, sem muita educação formal, tosco e algumas vezes até
vulgar. Começou a pregar ali, e quis Deus sacudir a esse povo. Em muito pouco
tempo a pequena capela com teto de palha estava lotada e os maiores vagabundos
da povoção estavam chorando mares de lágrimas e aqueles que tinham sido a
maldição da aldeia converteram-se na sua bênção; e onde antes houve todo tipo
de roubos e maldades em toda a vizinhança, já não as houve mais, porque os
homens que as faziam se encontravam na casa de Deus, alegres ao escutar de
Jesus crucificado. Escutai-me com atenção, não vos estou dizendo agora uma
história exagerada, nenhuma coisa que eu não saiba. Mas esta coisa lembro-a
claramente para louvor da graça de Deus, porque o Senhor quis fazer sinais e
maravilhas no nosso meio. Ele mostrou o poder do nome do Jesus e fez-nos
testemunhas desse Evangelho que ganha almas, que atrai corações relutantes e
molda de maneira nova a vida e a conduta dos homens. Há alguns irmãos aqui que
vão aos refúgios e lares para falar com essas pobres moças caídas que foram
resgatadas. Pergunto-me o que fariam se não levassem consigo o Evangelho a
essas moradas da miséria e da vergonha. Se levassem consigo uma folha arrancada
de um manual de teologia e fossem e lhes falassem com palavras e com filosofias
ribombantes, que benefício lhes poderiam proporcionar? Pois bem, o que não é bom
para elas não é bom para nós. Queremos algo que possamos entender, algo em que
possamos confiar, algo que possamos sentir; algo que dê forma ao nosso caráter
e à nossa conversação, e que nos faça semelhantes a Cristo.
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