Outrossim os santos não veem tudo
como espectadores indiferentes ou desinteressados mais que o próprio Cristo é
um espectador desinteressado. A felicidade dos santos no céu consiste, em
grande parte, em ver a glória de Deus que aparece na obra da Redenção, pois é
principalmente por isso que Deus manifesta sua glória, a glória da sua
sabedoria, santidade, graça e outras perfeições, aos santos e anjos, conforme é
evidente por muitas escrituras. Por conseguinte, não há que duvidar que muito
da felicidade deles consiste em ver o progresso desta obra em sua aplicação,
sucesso e os passos pelos quais o poder e sabedoria infinitos os levam à sua
meta. Eles estão com vantagens indescritivelmente maiores de desfrutarem o
progresso desta obra do que nós, visto que eles estão em maiores vantagens de
ver e entender os passos maravilhosos que a sabedoria divina dá em tudo o que é
feito e o fim glorioso que Ele obtém; bem como a oposição que Satanás faz e
como ele é confundido e vencido.
Eles
veem melhor a conexão de um evento com outro e a ordem de todas as coisas que
sucedem na Igreja, em épocas diferentes, que nos parecem confusas. Não apenas veem
estas coisas e regozijam-se nelas como visão gloriosa e bela, mas o fazem como
pessoas interessadas, assim como Cristo está interessado, possuindo estas
coisas em Cristo e reinando com Ele no seu Reino. O sucesso de Cristo na sua
obra de redenção, em trazer as almas para si mesmo, aplicando os benefícios
salvadores pelo seu Espírito e o avanço do Reino de graça no mundo, é a recompensa
prometida a Ele pelo Pai no concerto de redenção, pelo serviço duro e difícil
que Ele executou quando na forma de servo. Mas os santos participarão com Ele
da alegria desta recompensa, pois esta obediência, que é recompensada dessa
forma, lhes é computada, visto que são seus membros.
Assim
Abraão desfruta estas coisas quando acontecem, as quais lhe foram há muito
prometidas, vistas por ele de antemão e nas quais se regozijou. Ele desfrutará
o cumprimento da promessa de que todas as famílias da terra serão abençoadas na
sua semente, quando esta for completa. Todos os antigos patriarcas que morreram
crendo nas promessas das coisas gloriosas a serem cumpridas neste mundo, que
não tinham recebido as promessas, mas as vislumbravam, foram persuadidos por
elas e as abraçaram, desfrutam-nas de fato quando são cumpridas. Davi
contemplou e desfrutou o cumprimento dessa promessa em seu devido tempo, que
lhe fora feita muitas centenas de anos antes e era toda a sua salvação e todo o
seu desejo. Assim Daniel se levantará em sua sorte no fim dos dias apontados
por sua própria profecia. Assim os santos de outrora que morreram na fé, sem
terem recebido a promessa, são aperfeiçoados e têm a fé coroada pelas coisas
melhores realizadas nestes últimos dias do Evangelho, que eles veem e desfrutam
em seus dias.
3. Os santos no céu têm comunhão
com Cristo no serviço bem-aventurado e eterno de glorificar o Pai.
Quando
Cristo instituiu a Ceia do Senhor e comeu e bebeu com os discípulos à mesa,
dando-lhes nesse particular uma representação e penhor do futuro banquete com
Ele e da bebida do novo vinho no Reino do Pai celeste, nesse momento Ele os
conduziu em seus louvores a Deus no hino que cantaram. Não há que duvidar que
da mesma forma Ele conduz os discípulos glorificados ao céu. Davi, como o amado
salmista de Israel, conduziu a grande congregação do povo de Deus nos cânticos
de louvor. Nisto, como em outras coisas inumeráveis, ele tipifica a Cristo,
frequentemente mencionado na Escritura pelo nome de Davi. Muitos dos salmos que Davi escreveu eram
cânticos de louvor que ele, pelo espírito de profecia, proferiu em nome de
Cristo, como Cabeça da Igreja e conduzindo os santos nos louvores. Cristo no
céu conduz a assembleia gloriosa nos louvores a Deus como Moisés conduziu a congregação
de Israel pelo mar Vermelho, o que está implícito nas palavras: “Eles cantam o
cântico de Moisés e o cântico do Cordeiro.” João nos fala que ouviu uma voz
sair do trono dizendo: “Louvai o nosso Deus, vós, todos os seus servos, e vós
que o temeis, tanto pequenos como grandes” (Apocalipse 19:5). Quem proferiu
esta voz que saiu do trono, senão “o Cordeiro que está no meio do trono”
conclamando a assembleia gloriosa dos santos a louvar o seu Pai e Pai deles, o
seu Deus e Deus deles? Qual seja a consequência desta voz, ficamos sabendo nas
seguintes palavras: “E ouvi como que a voz de uma grande multidão, e como que a
voz de muitas águas, e como que a voz de grandes trovões, que dizia: Aleluia!
Pois já o Senhor, Deus Todo-poderoso, reina” (Apocalipse 19:6).
O
assunto que estamos considerando pode ser utilmente aplicado a modo de
exortação. Que sejamos todos exortados seriamente a buscar esse grande
privilegio do qual falamos, que quando deixamos este corpo, vamos habitar com o
Senhor (2 Coríntios 5:8). Não podemos permanecer para sempre neste tabernáculo
terrestre. Ele é muito frágil e logo se deteriorará e cairá, e está
continuamente sujeito a ser vencido por inumeráveis meios. Nossa alma em breve
tem de deixar o corpo e entrar no mundo eterno.
Quão
infinitamente grande será o privilégio e felicidade dos que, naquele momento,
irão estar com Cristo na sua glória, da maneira como foi representada! O
privilégio dos doze discípulos era grande por estarem constantemente com Cristo
como sua família no estado de sua humilhação. O privilégio dos três discípulos
era grande por estarem com Ele no monte da Transfiguração, onde lhes foi
mostrado uma tênue semelhança da futura glória Dele no céu, como eles viram
seguramente no atual estado fraco, frágil e pecador. Eles ficaram grandemente
encantados com o que viram e desejosos de fazer tabernáculos para morar neles e
não descer mais do monte. Também foi grande o privilégio de Moisés quando
esteve com Cristo no monte Sinai e lhe pediu que mostrasse a sua glória, e ele
o viu pelas costas quando Ele passou e o ouviu proclamar seu nome. Mas o
privilégio de que falamos não é infinitamente maior?
O
privilégio de estarmos com Cristo no céu onde Ele se assenta no trono, como o
Rei dos anjos e o Deus do universo, brilhando como o Sol daquele mundo de
glória — para habitarmos na visão plena, constante e perpétua da sua beleza e
brilho, conversarmos com Ele livre e intimamente e desfrutarmos seu amor
inteiramente, como amigos e irmãos, compartilharmos com Ele no prazer e gozo
infinitos que Ele tem no prazer do Pai, assentarmo-nos com Ele no trono,
reinarmos com Ele na posse de todas as coisas, participarmos com Ele da glória
da sua vitória sobre os inimigos e o progresso do seu Reino no mundo e
unirmo-nos com Ele nos alegres cânticos de louvor ao seu Pai e nosso Pai, ao
seu Deus e nosso Deus, para sempre e sempre. Não é este um privilégio digno de
ser buscado?
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