quinta-feira, 1 de novembro de 2012

Os Mortos Bem-aventurados (3)




IV. A alma do cristão desfruta um intercurso e convivência gloriosas e imediatas com Cristo.
 Enquanto estamos presentes com os nossos amigos, temos oportunidade de convivência livre e imediata com eles, a qual não temos quando ausentes. Então, por causa do intercurso muito mais livre, perfeito e imediato com Cristo que os santos desfrutam quando ausentes do corpo, eles são representados adequadamente a estar presentes com Ele.
 O intercurso mais íntimo torna-se a relação na qual os santos se firmam em Jesus Cristo, e sobretudo torna-se a reunião perfeita e gloriosa para a qual eles serão levados com Ele no céu. Eles não são meramente seus servos, mas seus amigos, irmãos e companheiros; sim, eles são o Cônjuge de Cristo. Eles são os esposados ou noivos de Cristo enquanto no corpo, mas quando vão para o céu, chega a hora do casamento com Ele, e o Rei leva-os para o seu palácio. Cristo, quando estava neste mundo, conversou da maneira mais amigável com os discípulos e permitiu que um deles se inclinasse no seu peito, mas eles terão a permissão muito mais completa e livre de conversar com Ele no céu.
 Embora Cristo esteja ali num estado de exaltação gloriosa, reinando na majestade e glória do soberano Senhor e Deus do céu e da terra, dos anjos e homens, contudo esta condição não impedirá a intimidade e liberdade do intercurso, mas, antes, a promoverá. Ele foi exaltado, não só para si mesmo, mas para eles. Ele é o Cabeça sobre todas as coisas no interesse deles, para que eles sejam exaltados e glorificados; e, quando eles forem para o céu, onde Ele está, eles serão exaltados e glorificados com Ele e não serão mantidos a maior distância. Eles estarão indizivelmente mais aptos para esta situação, e Cristo estará em circunstâncias mais adequadas para lhes dar esta bem-aventurança. A visão da grande glória do seu Amigo e Redentor não vai infundir-lhes temor respeitoso e mantê-los a certa distância, deixando-os com medo de se aproximarem; mas, pelo contrário, com mais vigor os atrairá, os animará e os enredará à liberdade santa. Eles saberão que Ele é o seu Redentor e Amigo amado, o mesmo que os amou com um amor agonizante e, pelo seu sangue, os remiu para Deus. “Sou eu; não temais” (Mt 14:27). “Não temas; eu sou  o que vive; fui morto, mas eis aqui estou vivo” (Ap 1:17,18). A natureza desta glória de Cristo que eles verão será tamanha que os atrairá e os encorajará, pois eles não só verão a majestade e grandeza infinitas, mas também a graça, condescendência, gentileza e doçura infinitas, iguais à sua majestade. Ele aparece no céu como “o Leão da tribo de Judá” (Ap 5.5), e também como “o Cordeiro que está no meio do trono.” Este Cordeiro será o pastor que “os apascentará e lhes servirá de guia para as fontes das águas da vida” (Ap 7:17).
 A visão da majestade de Cristo não lhes causará terror, mas só servirá para exalçar o prazer e a surpresa. Quando Maria Madalena estava a ponto de abraçar Jesus, cheia de alegria por vê-Lo vivo depois da crucificação, Jesus proibiu-a que o fizesse naquele momento, porque Ele ainda não havia ascendido. “Disse-lhe Jesus: Maria! Ela, voltando-se, disse-lhe: Raboni (que quer dizer Mestre)! Disse-lhe Jesus: Não me detenhas, porque ainda não subi para meu Pai, mas vai para meus irmãos e dize-lhes que eu subo para meu Pai e vosso Pai, meu Deus e vosso Deus” (Jo 20:16,17). Foi como se Ele tivesse dito: “Não é este o tempo e o lugar para essa liberdade que o teu amor deseja de mim. Isso está designado para o céu, depois de minha ascensão. Eu vou para lá, e tu que és minha verdadeira discípula deves, assim como meus irmãos e companheiros, logo estar lá comigo na minha glória.” Esse é o lugar designado para as expressões mais perfeitas de complacência e estima. Por conseguinte, os santos no céu encontram Jesus manifestando essas riquezas infinitas de amor para com eles, as quais Ele sentia desde a eternidade; e eles são capazes de expressar o amor que têm por Ele de uma maneira infinitamente melhor do que quando estavam no corpo. Assim, eles serão eternamente envolvidos pelos raios incalculavelmente luminosos, brandos e doces do amor divino, recebendo eternamente a luz e para sempre refletindo-a para a fonte.
 V. A alma do cristão é recebida numa comunhão gloriosa com Cristo na sua bem-aventurança.
 Os santos no céu têm comunhão com Cristo na sua glória e bem-aventurança no céu nos seguintes aspectos:
 1. Os santos no céu participam com Ele das delícias inefáveis que Ele tem no céu no prazer do seu Pai.
 Quando Cristo ascendeu ao céu, Ele foi recebido a uma bem-aventurança peculiar no prazer do Pai que, na paixão, se escondeu da face de Jesus; este prazer tornou-se relação na qual Ele estava com o Pai; e era uma recompensa satisfatória pelo grande e difícil serviço que Ele executara na terra. Então Deus mostrou-Lhe o caminho da vida, e trouxe-O à sua presença, onde há abundância de alegrias, para se assentar à sua mão direita, onde há prazeres eternamente, como está escrito acerca de Cristo (veja SI 16:11). Então o Pai fê-Lo o mais abençoado para sempre; Ele fê-Lo muitíssimo contente com o seu semblante. Os santos pela união com Cristo participam da relação filial dEle com o Pai e são herdeiros com Ele da felicidade no prazer do Pai, como parece estar insinuado pelo apóstolo e pelo salmista: “Eles se fartarão da gordura da tua casa, e os farás beber da corrente das tuas delícias; porque em ti está o manancial da vida; na tua luz veremos a luz” (SI 36:8,9). Os santos terão prazer participando com Cristo no seu prazer e verão luz na sua luz. Eles participarão com Cristo do mesmo rio de prazer, beberão da água da vida e do mesmo vinho novo no Reino do Pai. Esse vinho novo é especialmente aquela alegria e felicidade que Cristo e os verdadeiros discípulos participarão juntos na glória; que é a compra do sangue de Cristo ou a recompensa da sua obediência até a morte. Cristo, na sua ascensão ao céu, recebeu prazeres perpétuos à mão direita do Pai no prazer do amor do Pai como recompensa da sua obediência até a morte. Mas a mesma retidão é considerada tanto para a Cabeça quanto para os membros: e ambos terão comunhão na mesma recompensa, cada um de acordo com sua capacidade distinta.
 Os santos, no céu, participaram com Cristo do seu prazer com o Pai. Este facto manifesta a excelência transcendente da felicidade deles e a realidade deles serem admitidos a um privilégio imensamente mais elevado em glória do que os anjos.
 2. Os santos no céu participam com Cristo da glória daquele domínio ao qual o Pai o exaltou.
 Os santos, quando ascendem ao céu e são levados a sentarem-se junto com Cristo nas regiões celestiais, são exaltados para reinar com Ele. Por meio dEle são feitos reis e sacerdotes, e reinam com Ele e nEle sobre o mesmo Reino. Como o Pai lhe designou um Reino, assim Ele o designou para eles. O Pai designou o Filho para reinar sobre seu próprio Reino, e o Filho designa os seus santos para reinar no seu. Os santos no céu estão com os anjos, os ministros do Rei, por quem Ele administra os assuntos do Reino e que estão subindo e descendo continuamente do céu à terra e são empregados dia-a-dia como espíritos ministradores a cada membro individual da Igreja; ao lado da ininterrupta subida de almas dos santos que morrem de todas as partes da Igreja militante. Então os santos têm vantagem muito maior de verem o estado do Reino de Cristo e as obras da nova criação, do que tinham quando estavam neste mundo, como alguém que sobe ao topo de uma alta montanha tem maior vantagem de ver a face da terra neste mundo, do que tinha quando estava num vale profundo ou numa floresta espessa, cercado por todos os lados com as coisas que impedem e limitam a visão.

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