Spurgeon.
“Todos
aqueles, pois, que são das obras da Lei estão debaixo da maldição; porque está
escrito: Maldito todo aquele que não permanecer em todas as coisas que estão
escritas no livro da Lei, para fazê-las.” (Gl 3:10)
Mas,
alguém exclama: “Eu não me declararei culpado, pois ainda que esteja muito
consciente de que não permaneci ‘em todas as coisas escritas no livro da Lei’,
fiz o melhor que pude.” Essa é uma mentira; diante de Deus é uma falsidade. Não
o tens feito! Não tens feito o melhor que podias. Houve muitas ocasiões nas
quais poderias ter realizado um esforço melhor. Acaso, aquele jovem que está
acolá, atrever-se-ia a dizer-me que está fazendo agora o melhor que pode? Que
não pode reprimir a sua risada na casa de Deus? É possível que seja difícil
para ele que o faça, mas é possível que poderia, se quisesse, refrear-se de
insultar o seu Criador, na Sua cara. De certo, nenhum de nós tem feito o melhor
que podia. Em cada período, em cada momento, houve oportunidades de escapar da
tentação. Se não tivéssemos tido nenhuma liberdade de escapar do pecado,
poderia haver alguma desculpa por ele; contudo, houve pontos decisivos na nossa
história quando teríamos podido decidir pelo correto ou o incorreto, mas temos
feito o mal e evitamos o bem, e dirigimo-nos a esse caminho que conduz ao
Inferno.
“Ah, mas eu declaro, senhor,” diz outro, “que embora seja
certo que tenho quebrantado essa Lei, sem dúvida alguma, não fui pior do que os
meus semelhantes.” E, por certo, esse é um argumento muito triste, pois de que
te serve? Seres condenado em grupo, não te serve de mais consolo, do que se tu
fores condenado sozinho. É certo que não foste pior do que os teus semelhantes,
porém, isto não te servirá de nada. Quando os ímpios forem atirados para o
Inferno, será de muito pouco consolo para ti que Deus diga: “Apartai-vos de
mim, malditos” a mil pessoas juntamente contigo. Recorda que a maldição de
Deus, quando arraste uma nação ao Inferno, será sentida por cada indivíduo da
multidão de igual maneira como se o castigo fosse para um só indivíduo. Deus
não é como os nossos juízes terrestres. Se os vossos tribunais estivessem
saturados de prisioneiros, poderiam sentir-se inclinados a tratar levianamente
muitos casos. Mas, com Jeová não acontece o mesmo. Ele é tão infinito na Sua
mente, que a abundância de criminosos não será uma dificuldade para Ele.
Tratará contigo com a mesma severidade e justiça como se não houvesse nenhum
outro pecador em todo mundo.
E eu pergunto-te: o que tens tu que ver com os pecados de
outros homens? Tu não és responsável por eles. Deus determinou que tu te
sustentarias ou cairias por ti mesmo. De acordo com as tuas próprias ações
serás julgado. O pecado da rameira pode ser mais grave do que o teu, porém, tu
não serás condenado pelas suas iniquidades. A culpa do assassino pode
ultrapassar em muito as tuas transgressões, porém, tu não serás condenado pelo
assassino. Oh, homem, a religião é algo entre Deus e a tua própria alma; e,
portanto, imploro-te que não olhes para o coração do teu vizinho, mas para o
teu próprio coração.
“Ai,” exclama alguém, “Mas eu esforcei-me, muitas vezes,
para guardar a Lei, e penso que o logrei por algum tempo.” Escuta outra vez a
leitura do versículo: “Maldito todo aquele que não permanecer em todas as
coisas escritas no livro da Lei, para as fazer.” Oh, senhores!, não é algum
rubor febril nas faces que brota por uma irresolução doentia, o que Deus
reconhece como a saúde da obediência. Não se trata de uma ligeira obediência
durante uma hora, o que Deus aceitará no dia do juízo. Ele usa a palavra
“permanecer;” e, a menos que, desde a minha mais temporã infância, até ao dia
em que os meus cabelos brancos desçam à sepultura, tenha permanecido em
obediência a Deus, deverei ser condenado. A menos que tenha servido
obedientemente a Deus, desde o primeiro despertar da razão, quando comecei a
ser responsável, até que, como um arbusto de trigo, seja juntado no celeiro do
meu Senhor, a salvação pelas obras será impossível para mim, e eu serei condenado
se estou apoiado no meu próprio fundamento. Não é, afirmo-o, alguma flutuante
obediência o que salvará a alma. Tu não permaneceste “em todas as coisas
escritas no livro da Lei,” e, portanto, estás condenado.
“Mas,” dirá outro, “Há muitas coisas que eu não tenho feito,
mas apesar de tudo, tenho sido muito virtuoso.” Essa, também, é uma pobre
desculpa. Supõe que tens sido virtuoso; supõe que tens evitado muitos vícios:
lê o meu versículo. Não é minha a palavra, mas a palavra de Deus, lê-o: “Todas
as coisas.” Não diz: “Algumas coisas.” “Maldito todo aquele que não permanecer
em todas as coisas escritas no livro da Lei, para as fazer.” Agora, tens posto
em prática todas as virtudes? Tens-te apartado de todos os vícios? Podes pôr-te
de pé e declarar: “Nunca fui um bêbado”? Entretanto, serás condenado, se
tiveres sido um fornicador. Respondes acaso: “Nunca fui imundo”? Entretanto,
quebrantaste o dia de repouso. Declaras-te culpado desse cargo? Acaso declaras
que nunca quebrantaste o dia de repouso? Tu tomaste o nome de Deus em vão, não
é verdade? Em alguma parte ou em outra, a Lei de Deus pode ferir-te. É certo
(deixa agora que fale à tua consciência e afirme o que eu assevero), é certo
que não permaneceste “Em todas as coisas escritas no livro da Lei.” E mais, estou
convencido de que não permaneceste plenamente em nenhum mandamento de Deus,
pois o mandamento é extremamente amplo. Não é o ato patente, simplesmente, o
que condenará um homem; é o pensamento, a imaginação, a concepção do pecado, os
que bastam para arruinar a alma. Recordai, meus queridos ouvintes, que estou
pregando agora a própria palavra de Deus, não uma rigorosa doutrina da minha
propriedade. Se nunca tivésseis cometido um só ato de pecado, o mero pensamento
de pecado, a simples imaginação do pecado bastariam para arrastar a alma para o
Inferno para sempre.
Se tivesses nascido numa cela, e não tivesses podido sair
nunca para o mundo, para cometer atos de lascívia, de assassinato ou de roubo,
bastaria o pensamento do mal nessa cela solitária, para apartar a tua alma para
sempre do rosto de Deus. Oh!, não há ninguém aqui que possa ter a esperança de
escapar. Cada um de nós deve inclinar a sua cabeça diante de Deus, e clamar:
«Culpado, Senhor, culpado, cada um de nós é culpado: ‘Maldito todo aquele que
não permanecer em todas as coisas escritas no livro da Lei, para as fazer.’»
Quando olho o teu rosto, oh Lei, o meu espírito treme de horror. Quando escuto
os teus trovões, o meu coração derrete-se como a cera no meio das minhas
entranhas. Como poderia suportar-te? Se estiver para ser julgado no fim, pela
minha vida, de certeza não necessitarei de um juiz, pois eu serei o meu próprio
acusador voluntário, e a minha consciência será uma testemunha para me
condenar.
Penso que não preciso de me alargar mais neste ponto. Oh,
tu, que estás sem Cristo e sem Deus, não permaneces condenado diante Dele? Tira
de ti todas as máscaras, e despreza todas as desculpas; que cada um de nós
arremesse ao vento todas as suas vãs pretensões. A menos que contemos com o
sangue e a justiça de Cristo, para que nos cubram, cada um de nós deve
reconhecer que esta sentença fecha as portas do Céu na nossa cara, e unicamente
nos prepara para as chamas da perdição.
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