sexta-feira, 3 de maio de 2013

A SEPARAÇÃO EM RELAÇÃO AO MUNDO



C. H. Mackintosh

 (Resposta a uma carta)
        Quanto à sua terceira pergunta, só temos de dizer que o Novo Testamento nos ensina, em vários lugares, que o cristão está morto para o mundo; não meramente o está para certas coisas imorais do mundo — especialmente para as partes más do mundo—, mas para o mundo em todos os seus aspectos.
        O que, pois, tem uma pessoa morta a ver com a política do mundo? Como cristãos, somos enviados a este mundo, assim como o foi Jesus. O que teve Ele que ver com a política do mundo? Ele pagou impostos, e assim o devemos fazer nós. Obedeceu às autoridades, e nós devemos fazer o mesmo. Padeceu debaixo dos poderes deste mundo, e nós podemos ser chamados ao mesmo. Somos instruídos a que devemos orar pelas autoridades, e devemo-lo fazer sem ter em conta absolutamente a natureza ou o caráter do poder debaixo do qual nos toque viver.
        De fato, quando o Apóstolo estabeleceu este preceito (1TImóteo 2), o cetro imperial estava nas mãos de um dos piores homens que jamais pisaram a Terra(1). Ao cristão é-lhe ensinado que deve sujeitar-se às autoridades (Romanos 13); mas jamais se lhe ensina que deva exercer esse poder, nem só vez, mas justamente o contrário: “A nossa cidadania está nos céus” (Filipenses 3:20). Somos só peregrinos e estrangeiros no mundo. A Cruz de nosso Senhor cortou toda a atadura entre nós e este mundo. A ressurreição introduziu-nos num mundo totalmente novo. Na morte de Cristo zarpamos das terras do velho mundo. Na Sua Ressurreição, desembarcamos na praia do novo. “morrestes, e a vossa vida está escondida com Cristo em Deus”, portanto, “ponham o olhar nas coisas de cima, não nas da terra” (Cl 3:2-3). Oh, que graça é conhecer o poder formativo e santificador desta preciosa linha de verdade!
        Você está completamente certo no seu julgamento a respeito de Gênesis 9:6. Permanece irrevogável. A lei não o alterou; tampouco o faz o Evangelho. Permanece com toda a sua solene força como uma lei do governo de Deus; e se nós tentássemos modificá-lo de acordo com a nossa própria sabedoria ou benignidade, far-nos-íamos simplesmente mais sábios ou benignos de que Deus.      Não devemos confundir a graça do Evangelho com o divino governo do mundo. O cristianismo não interfere com as disposições da divina Providência. Ele ensina-nos que devemos atuar com graça para todos; mas aplicar os princípios do Evangelho ao governo deste mundo, faria que tudo fosse confusão.
        E, além disso, querido amigo, o que temos de ver nós, como cristãos, enviando demandas ou protestos ao Governo? Nada absolutamente! Temos o dever de orar pelo Governo e de obedecer-lhe; ou devemos padecer no caso de que este nos imponha coisas que pretendam fazer-nos desobedecer a Deus. Mas, entremetermo-nos nas suas leis é, na prática, negar a nossa cidadania celestial. E, no caso a que você se refere, tentar impedir o curso da justiça, é ir contra o próprio mandamento direto de Deus: “quem derramar sangue de homem, pelo homem seu sangue será derramado.” (Gênesis 9:6)
        Em que lugar foi abolido este mandamento? Em nenhum. Por isso, os cristãos devem tomar cuidado em não nos colocarmo-nos onde não devemos, nem tentar trocar o curso dessa disposição debaixo da influência dos nossos sentimentos naturais ou de sentimentalismos. Não nos atrevemos a adicionar princípios cristãos por quanto os verdadeiros princípios cristãos sempre nos conduzirão a inclinarmo-nos ante a autoridade da Palavra de Deus, mesmo que não sejamos capazes de compreendê-la com exatidão ou de conciliá-la com os nossos próprios sentimentos.
        Consideramos que 2 Coríntios 6:14-18 é uma concludente resposta à sua pergunta. Se esta porção da Escritura não governa a consciência de um homem, o raciocínio é mais que inútil.
        “A nossa cidadania está nos céus”. “Morrestes, e a vossa vida está escondida com Cristo em Deus.” O que tem de ver um homem morto com a política? O cristão é alguém que morreu em Cristo — morto para o pecado, morto para a lei e morto para o mundo—; e por isso ele, como Deus o vê, não tem mais a ver com estas coisas como o que teria de ver um homem morto que jaz sepultado debaixo do chão. Ele está vivo em Cristo, vivo para Deus, vivo para tudo aquilo que é espiritual, celestial e divino. Ele está na nova criação. A sua moral, os seus costumes, a sua religião e a sua política são todas da nova criação, são todas celestiais e divinas. Ele tem rompido com o mundo, tanto como com o espírito do mundo, como com os seus princípios. Está neste mundo para andar como estrangeiro e peregrino; para viver como cristão, como um homem espiritual e celestial; mas não é do mundo para andar como um homem mundano, carnal e natural. “Se alguém está em Cristo, nova criatura é” (2 Coríntios 5:17). Tomara que vivamos segundo o poder destas coisas.

Tradução de Carlos António da Rocha

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